Energia acessível e limpa na periferia sul de São Paulo

A sustentabilidade é um dos temas prioritários tanto no processo interno da Fundação ABH quanto nas ações que apoiamos em prol do desenvolvimento comunitário da periferia sul de São Paulo.

O tema também está dentro da categoria de Vida Digna e Bem-Estar da nossa mandala do PerifaSul 2050, levantadas pelos atores locais como temáticas que merecem ser trabalhadas com prioridade até 2050 nas quebradas da zona sul paulistana.

Dentre suas variáveis está a produção de energia limpa e acessível que é um dos 17 ODSs (Objetivos de Desenvolvimento Sustentável) da ONU.

Neste artigo, falaremos sobre como a produção de energia do Brasil se tornou mais sustentável nos últimos anos, saber qual a importância disso para o país e conhecer um projeto que leva energia acessível e limpa para a periferia sul da capital paulista.

O avanço da energia acessível e limpa no Brasil e no mundo

De acordo com a Revisão Estatística de Energia Mundial (Statistical Review of World Energy), o Brasil fica atrás apenas dos Estados Unidos na produção de energia acessível e limpa.

O levantamento, que considera apenas fontes como eólica, solar e geotérmica, apontou que a produção de energia acessível e limpa nos EUA chegou a 8.43 EJ (ou exajoules, unidade para medir grandes quantidades de energia) em 2022. No Brasil esse total foi de 2.53 EJ.

O estudo faz ainda um panorama da evolução da produção mundial de energia acessível e limpa ao longo de dez anos e constatou que no Brasil esse total só aumentou desde 2012, quando o montante equivalia a 0.99 EJ.

Confira os detalhes na tabela abaixo:

Brasil bate recorde na produção de energia limpa

As boas notícias sobre o assunto não param por aí. Segundo dados divulgados pela da Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE), em maio de 2023, o Brasil produziu 70 mil MWmed só nos primeiros meses do ano, sendo que 94% desta energia elétrica foi gerada por fontes renováveis: hidrelétricas (77%), seguidas das usinas eólicas (12%), solares (3%) e biomassa (2%).

De acordo com a CCEE, o Brasil bateu um novo recorde na produção de energia acessível e limpa, superando o que foi alcançado nos últimos 10 anos.

Outra conquista importante é de que as termelétricas, mais caras e poluentes, responderam por apenas 5% da produção de energia elétrica do país.

Especialistas apontam que os resultados positivos se devem a uma combinação de chuvas fortes sobre os principais reservatórios do Brasil, a ampliação dos investimentos em energia eólica e solar, além do desaquecimento da economia, que reduz a demanda por energia.

“Estamos chegando ao final do período úmido com níveis confortáveis nos reservatórios de água do país e com boa representatividade das fontes alternativas, que ajudam a complementar a oferta de energia”, analisou o presidente do CEE, Rui Altieri, em entrevista ao site Canal Solar.

Em depoimento ao G1, o professor do Grupo de Estudos do Setor Elétrico da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Nivalde de Castro, afirmou que a segurança energética deixou de ser um problema por aqui.

"Nós hoje temos uma matriz elétrica onde o mundo quer chegar em 2050. Então isso é uma vantagem muito grande para o Brasil e é uma vantagem competitiva", explicou Nivalde.

Energia para Todos 4.0: energia limpa e acessível PerifaSul de São Paulo

Os caminhos da energia limpa e acessível chegaram na Periferia Sul de São Paulo através das mãos da cientista ambiental Graziela Gonzaga, que criou a primeira microgeradora de energia solar da periferia sul de São Paulo através do projeto Energia para Todos 4.0.

Graziela teve a ideia no trem, enquanto voltava para casa após um dia de trabalho. Durante o trajeto, ela fez alguns questionamentos a si mesma: “Estamos falando tanto de inovação, mas será que estamos incluindo pessoas das comunidades mais pobres? Será que essas pessoas podem também ter acesso aos recursos de sustentabilidade?”

A partir daí, a cientista ambiental decidiu submeter a ideia que teve ao programa de inovação Challenge Innovation Hub 2019, com um projeto piloto que tinha o objetivo de fornecer energia solar para uma comunidade do Jardim Nakamura, bairro da periferia sul de São Paulo.

A ideia foi aprovada e placas fotovoltaicas foram instaladas na comunidade. Para isso, Graziela recebeu o apoio de voluntários, além da parceria com o Instituto Favela da Paz e a empresa CL Solar.

Entretanto, nem tudo foram flores ou sol no caminho deste projeto. Graziela nos contou que o Energia para Todos não carrega o número 4.0 em seu nome por acaso. Acontece que, antes de encontrar o caminho certo, a cientista precisou fazer quatro tentativas para conseguir apoio para desenvolver sua ideia.

“No primeiro projeto, tivemos dificuldade para encontrar alguém que acreditasse na nossa ideia dentro das comunidades, foi só na quarta tentativa que encontramos o Instituto Favela da Paz. Depois também tivemos o desafio da pandemia. O projeto se iniciou em 2020, no começo da pandemia, isso atrapalhou bastante já que em muitas etapas, era necessário fazer visitas ao local”, relatou Graziela.

Desdobramentos do Projeto Energia para Todos 4.0

Diante da repercussão midiática e na própria comunidade, a cientista ambiental decidiu tornar acessível o conhecimento sobre instalação de painéis solares e seus benefícios para o território.

Graziela lembra que uma das premissas do projeto piloto era o engajamento da população local por meio da utilização de mão de obra voluntária, devidamente treinada para a instalação dos painéis solares.

“Com isso, buscamos não só o contato com formas de energia renovável, mas também trazer novas perspectivas em relação ao mercado de trabalho, uma vez que profissionais dessa área serão cada vez mais requisitados”, explicou ela.

Somando a ideia com o apoio do Instituto Favela da Paz, o projeto teve desdobramentos como a criação de um curso de formação para instaladores fotovoltaicos. A primeira turma se formou em julho de 2023.

Graziela revelou também quais são os próximos passos do Projeto Energia para Todos 4.0 na zona sul de São Paulo.

“Estamos em fase de execução da primeira associação solar da periferia, que ajudará a reduzir os gastos de conta de luz de aproximadamente 30 famílias. Atualmente, estamos na fase de seleção das pessoas e montagem do estatuto da associação”, contou a cientista ambiental.

Outras iniciativas que são referência em tecnologias sustentáveis na periferia

Instituto Favela da Paz

Parceiro de Graziela Gonzaga no Projeto Energia para Todos 4.0, o Instituto Favela da Paz tornou-se referência mundial em tecnologias sustentáveis. Fundada em 2010 pelos irmãos Fábio e Cláudio Miranda de Moura, a organização, que fica no distrito do Jardim Ângela, na periferia sul de São Paulo, começou a investir em aulas de música e produção de instrumentos sustentáveis.

Entretanto, durante uma viagem a Portugal, Cláudio conheceu as energias renováveis e os sistemas de biogás, que convertem o lixo orgânico da cozinha em gás. Assim que retornou ao Brasil, criou o projeto Periferia Sustentável, com o intuito de investir no desenvolvimento de tecnologias sustentáveis e de baixo custo, que pudessem ser replicadas no território.

A ideia deu certo! Depois de estudar bastante sobre energias renováveis, ele criou o primeiro sistema de biogás no Brasil, que foi reproduzido em diversas comunidades do país e, em 2021, na Conferência das Partes das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP), foi reconhecido como um dos 17 projetos de sustentabilidade mais inspiradores do mundo.

Atualmente, o Instituto Favela da Paz realiza oficinas que ensinam à população a aproveitar os recursos naturais disponíveis nas comunidades, desenvolver biodigestores e outros sistemas de energia renovável, como a geração de energia solar.

Na parceria com o Projeto Energia para Todos 4.0 e com o apoio da Embaixada Australiana, a ideia é transformar o Instituto em um centro de ensino de instalação de painéis solares e criar uma cooperativa solar composta por 110 painéis com capacidade para gerar energia atendendo no mínimo 20 famílias do território.

Hoje, o Instituto é autossuficiente em energia, que é gerada através de um sistema fotovoltaico, que conta 22 painéis com potência de 900 kW/h, e supre 100% da demanda local, inclusive no aquecimento da água para banho. Além disso, a água da chuva é coletada e reutilizada no banho, que é aquecida por um aquecedor de água espiral solar no telhado, já a água de beber vem da mina de onde brota pura e é considerada própria para consumo após diversos testes serem feitos.

As tecnologias sustentáveis desenvolvidas pelo Instituto Favela da Paz beneficiam cerca de 200 alunos por mês e as quatro famílias que a organização abriga em suas dependências.

Litro de Luz Brasil

Litro de Luz Brasil é uma iniciativa presente em 15 países, incluindo o Brasil, onde, desde 2014, realiza ações de iluminação em comunidades das cinco regiões do país. 

A organização já instalou mais de 4.000 soluções de iluminação solar, feitas com materiais simples e recicláveis, como cano PVC e garrafa PET, que beneficiaram pelo menos 25.000 brasileiros e mais de 120 comunidades, incluindo a periferia sul de São Paulo.

O Litro de Luz Brasil trabalha em parceria com a comunidade para implementar o sistema de iluminação solar no território, capacitando os moradores para a instalação, replicação e manutenção da tecnologia. Atualmente, a organização conta com cerca de 200 voluntários em atividade, inclusive na gestão da organização, além dos funcionários contratados.

Em 2016, a Fundação ABH e a BrazilFoundation apoiaram a primeira ação do Litro de Luz Brasil na Amazônia, que resultou em 240 soluções instaladas, entre postes e lampiões solares, que beneficiaram sete comunidades, impactando 800 pessoas, dentre elas 60 voluntários e 20 embaixadores capacitados e formados para manter as tecnologias funcionando.

“Graças ao recurso fornecido pela BrazilFoundation em parceria com a Fundação ABH, pudemos realizar nossa primeira ação na Amazônia, implantando 20 postes e 10 lampiões solares em comunidades ribeirinhas, além de formar e capacitar nossos primeiros embaixadores (moradores da comunidade que serão responsáveis por replicar nossa tecnologia para outras comunidades mais distantes)”, disse a presidente do Litro de Luz, Laís Higashi, em entrevista ao site da BrazilFoundation.

Na mesma reportagem, o Fundador do Litro de Luz Brasil, Vitor Belota, resumiu o grande objetivo da organização: “Queremos alcançar um mundo onde toda criança possa ler um livro dentro de casa e onde a luz não seja apenas para quem possa pagar”.

É por motivos e exemplos como estes que falamos que a periferia sul de São Paulo é potência! Vida longa à Energia Para Todos 4.0 e a todas as organizações que atuam para que as comunidades de todo o país tenham direito ao acesso à energia limpa e renovável e pela proteção do meio ambiente!

Conhece outras iniciativas bacanas que desenvolvem trabalhos nesse sentido? Compartilhe conosco, pois vamos adorar conhecê-las!!!